Blog do Mario Magalhaes

Da eternidade, pioneiros do PSB se horrorizam com a bandalheira de 2017
Comentários Comente

Mário Magalhães

Resultado de imagem para uol heráclito fortes

Heráclito Fortes: cochila, mas não dorme no ponto – Foto Pedro Ladeira/Folhapress

 

Era uma baita seleção, com gênios da raça como Mário Pedrosa, Antônio Cândido e Sérgio Buarque de Holanda.

De gente decente, como João Mangabeira e Hermes Lima.

Eles foram alguns dos pioneiros do Partido Socialista Brasileiro.

A agremiação foi fundada em 1947.

Seu germe havia sido a Esquerda Democrática, organizada dois anos antes com militantes que combatiam a ditadura do Estado Novo (1937-1945).

Como todos os partidos, o PSB foi fechado à força em 1965, pela ditadura seguinte.

Reorganizado em 1985, teve entre os que o reviveram Evandro Lins e Silva e Rubem Braga.

Anos mais tarde, Miguel Arraes se incorporaria.

É possível endossar ou não as ideias, de tudo que é tipo, dos mencionados acima.

Mas que a turma era de responsa, como era.

Hoje, um dos figurões do PSB é o deputado federal Heráclito Fortes.

Veterano servidor da ditadura falecida em 1985, ele é identificado como Boca Mole numa planilha da Odebrecht.

Da bancada de três dezenas e meia de representantes na Câmara, o PSB deve perder uns dez deputados para o DEM ou o PMDB.

Eles apoiam o governo zumbi de Michel Temer.

O pessoal da eternidade viu de tudo na vida.

Mas certamente não deixa de se horrorizar com as bandalheiras cometidas em 2017, em nome da sigla que no passado prestou tantos serviços à cidadania.

( O blog está no Facebook e no Twitter )


Guto Ferreira: machista e obtuso
Comentários Comente

Mário Magalhães

Resultado de imagem para uol guto ferreira

Guto Ferreira, técnico do Inter – Foto Jeferson Guareze/AGIF

 

O pedido de desculpas do técnico Guto Ferreira pelo coice pronunciado depois da vitória do Inter contra o Luverdense merece ser saudado.

Mas não impede algumas reflexões sobre o que vai na cachola do técnico.

Indagado pela repórter Kelly Costa a respeito de erros em finalizações, ele respondeu desqualificando a entrevistadora:

''Desculpe, eu não vou fazer essa pergunta para você porque você é mulher e de repente não jogou [futebol]. Mas a situação de repente de ter praticado um esporte… Todo atleta sob pressão tem a dificuldade de ter o foco no lance final. Ele trabalha contra a confiança dele também. De ele acertar para ter a confiança. Então eu ia fazer uma pergunta para você se daqui a pouco você na condição… se você já jogou, para perceber essa situação… Mas de repente eu consegui trazer a resposta mais para essa situação… de canalizar dessa maneira''.

O pedido de desculpas não foi contido, e sim _parabéns_ explícito:

''Gostaria de pedir desculpas à Kelly Costa, eu acho que fui muito infeliz no raciocínio, acabei me atrapalhando, não quero mudar a opinião de ninguém. Respeito a opinião de todo mundo, sei que errei e estou aqui pedindo desculpas''.

Sua reação original contém um raciocínio escancarado e outro bandeiroso.

O bandeiroso tem a ver com o fato de a jornalista ser mulher. Por isso, ela eventualmente não teria jogado e supostamente saberia menos de futebol.

O escancarado supõe que só pode entender de pressão em jogador quem foi boleiro.

Tal visão é contraditória com a exigência contemporânea de apoio psicológico a muitíssimos jogadores, justamente pela pressão que eles sofrem na atividade competitiva profissional. A maioria dos psicólogos esportivos no futebol não competiu profissionalmente.

Mais grave é imaginar que o capítulo como jogador é imprescindível na biografia de quem entende de futebol.

Também para trabalhar como técnico?

Carlos Alberto Parreira, técnico da seleção campeã em 1994, não foi jogador.

Nem Cláudio Coutinho, o artífice do time do Flamengo que, treinado por Paulo César Carpegiani, conquistou o Mundial Interclubes em 1981.

Idem Paulo Autuori, duas vezes campeão da Libertadores.

Ou Oswaldo de Oliveira, que levou o Corinthians ao título mundial.

Os técnicos que mais me encantaram e encantam foram boleiros, e dos bons: Telê Santana e Pep Guardiola.

O que não significa que ter estado em campo seja condição para sacar de futebol.

Assim como um cracaço pode resultar em mau técnico.

Quem entregaria o seu time para o Pelé treinar?

Pernas de pau, como Arsène Wenger e José Mourinho, se saíram tremendos técnicos.

Que eu saiba, o Guto Ferreira não jogou, ao menos como profissional.

Se jogou, pouca gente teve conhecimento.

Só por isso não poderia fazer o que faz, porque ''de repente não jogou''?

( O blog está no Facebook e no Twitter )


O segredo por trás da provocação de Ricardo Teixeira
Comentários Comente

Mário Magalhães

Resultado de imagem para uol ricardo teixeira

Ricardo Teixeira, em 2016, no enterro do ex-sogro João Havelange – Foto Tasso Marcelo/AFP

 

Ángel María Villar, presidente da Real Federação Espanhola de Futebol e vice da Fifa, foi em cana hoje. As autoridades da Espanha o acusam de afanar dinheiro público. Villar foi amigão de Ricardo Teixeira nos imbroglios intestinos da Fifa.

Mais amigo ainda do brasileiro é Sandro Rosell, ex-presidente do Barcelona preso em maio por alegada lavagem de dinheiro. O cartola repassou ao menos R$ 23,8 milhões a Teixeira e parentes do ex-chefão da CBF.

Enquanto a casa cai na Europa, Ricardo Teixeira segue bem fagueiro por aqui.

E olha que há notícia de ordem de prisão contra ele, em virtude de negócios e negociatas com Rosell em torno da seleção brasileira. A confirmar.

Mas a ordem teria sido emitida na Espanha, é claro.

No Brasil, a vida do antigo genro de João Havelange continua sem maiores abalos.

No fim do mês passado, numa entrevista exemplar, o repórter Sérgio Rangel indagou a Teixeira sobre eventual delação premiada dele nos Estados Unidos.

O dirigente aposentado negou a dita colaboração e emendou de bate-pronto: ''Tem lugar mais seguro que o Brasil? Qual é o lugar? Vou fugir de quê, se aqui não sou acusado de nada? Você sabe que tudo de que me acusam no exterior não é crime no Brasil. Não estou dizendo se fiz ou não''.

A frase ''tem lugar mais seguro que o Brasil?'' constitui lição mais contundente do que uma coleção de estudos sobre impunidade.

A afirmativa, de tão acintosa, equivale a provocação.

Para provocar, é preciso ter convicção de que não corre perigo.

E até agora _até agora_ Teixeira não correu mesmo.

Qual o seu segredo para aprontar e provocar sem que nada lhe aconteça no Brasil?

Adoraria saber qual é o cobertor misterioso que esquenta as suas costas.

( O blog está no Facebook e no Twitter )


O Rio doente
Comentários Comente

Mário Magalhães

Resultado de imagem para uol pezao francisco dornelles

Pezão e Dornelles, depois da eleição de 2014 – Foto Armando Paiva/Fotoarena/Folhapress

 

Luiz Fernando Pezão tirou licença do cargo para cuidar da saúde. A assessoria do governador do Rio informou que ele tem problemas ''relacionados ao seu quadro metabólico (descompensação do diabetes, aumento de peso, entre outros)''. A saúde do bolso vai bem: a nota omitiu que o peemedebista foi para um spa de luxo; uma semana de hospedagem com a mulher sai no mínimo por quase R$ 15 mil, mais ou menos o salário líquido mensal do parceiro de Sérgio Cabral. Pezão venceu um câncer.

Enquanto ele se recupera no spa, governa Francisco Dornelles. Em março, o vice-governador foi internado. De acordo com a versão oficial, para um cirurgia urológica simples. Um ano antes, o sobrinho de Tancredo Neves tinha sofrido uma hemorragia intestinal.

O presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani, também se licenciou. Está no hospital. O correligionário de Pezão e Cabral será operado para a retirada de um câncer.

Nunca a saúde de alguns protagonistas do poder serviu tanto como metáfora para os males do Rio de Janeiro.

Melhoras a todos, sobretudo para o Rio.

( O blog está no Facebook e no Twitter )


Sentença reforça semelhança de ‘triplex do Lula’ com ‘apartamento do JK’
Comentários Comente

Mário Magalhães

4

5

 

A leitura das 92.742 palavras da sentença assinada ontem pelo juiz federal Sérgio Fernando Moro permite supor que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha mesmo cometido os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelos quais foi condenado a nove anos e seis meses de reclusão.

A decisão permite igualmente supor que Lula seja inocente no processo, relativo ao triplex no Guarujá. O conjunto indiciário não parece oferecer provas acima de qualquer dúvida razoável de que o ex-presidente seja ou tenha sido o dono do imóvel cuja propriedade seria ocultada e dissimulada por ele. Não é evidente que tenha pedido, recebido ou aceito promessa de vantagem indevida em virtude da função pública que exerceu.

Os indícios e provas colhidos na investigação expõem a inequívoca promiscuidade entre Lula e o empreiteiro José Adelmário Pinheiro Filho, vulgo Léo Pinheiro, sócio da OAS. ''O Léo'', como Lula se referiu ao empresário, com intimidade, no interrogatório em Curitiba.

A relação promíscua é certa e provada, mas não o cometimento de crimes decorrentes ou na origem dela. Ao menos na ação sobre o triplex _há outras quatro em andamento, com Lula na condição de réu. É a impressão que fica ao percorrer os 581.882 caracteres da sentença (incluindo espaços).

Existem provas acima de qualquer dúvida razoável de que no governo Lula a corrupção vigorou na Petrobras, assim como nas administrações da sua sucessora, Dilma Rousseff, e do seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso. E de que o Partido dos Trabalhadores manteve e eventualmente ampliou esquemas criminosos de financiamento de campanha e roubalheiras aparentadas (talvez nunca se saiba se a corrupção se ampliou ou se o que aumentou foi o controle sobre a rapina do patrimônio público). O PT igualou-se a PMDB, PSDB e companhia. Lambuzou-se, no eufemismo consagrado do petista Jacques Wagner.

Daí a provar cabalmente que o triplex do Condomínio Solaris é ou era de Lula, ou lhe foi prometido como propina, há distância.

A sentença judicial reforça a semelhança do caso do ''triplex do Lula'' com o do ''apartamento do JK''. Como contado aqui no blog no ano passado, o ex-presidente Juscelino Kubitschek foi investigado pela ditadura como alegado proprietário oculto de um apartamento na avenida Vieira Souto, debruçado sobre a praia de Ipanema. Ele morava lá. Sua mulher, Sarah, mudou o projeto do imóvel, provocou demissão de um mestre de obras. Mais tarde confirmou-se que o dono do apartamento era um empresário amigo de Juscelino.

Pode ser que eu esteja errado. Mas o caso do triplex do século 21 continua lembrando o episódio do apartamento dos anos 1960.

Abaixo, reproduzo o post de março de 2016 com pormenores sobre o ''apartamento do JK''.

Tudo é história.

*

Tratado como ladrão, JK foi acusado de ser dono de imóvel em nome de amigo

Depois de deixar a Presidência, Juscelino Kubitschek (1902-1976) foi morar num apartamento novinho em folha na avenida Vieira Souto, Ipanema, o metro quadrado mais caro do país.

A empreiteira que ergueu o prédio havia tocado na região Sul uma obra concedida pela administração JK (1956-1961).

O projeto arquitetônico do prédio foi desenhado por Oscar Niemeyer, que nada cobrou pelo serviço.

Mais de uma vez o ex-presidente visitou as obras do apê que viria a ocupar.

Idem sua mulher, dona Sarah, que pediu numerosas alterações no projeto original.

Um mestre de obras foi afastado, devido a reclamações da antiga primeira-dama.

O imóvel era espaçoso. Jornais publicariam que tinha 1.400 metros quadrados, o que parece exagero. Mas nele JK chegou a discursar para centenas de pessoas.

Juscelino pagava um aluguel irrisório ou morava de graça _as versões variam.

O apartamento em frente ao mar estava em nome de uma empresa controlada pelo banqueiro Sebastião Pais de Almeida.

Multimilionário, o empresário era amigo de JK, em cujo governo havia sido ministro da Fazenda.

Em junho de 1964, a ditadura recém-instalada cassou o mandato de senador de Juscelino e suspendeu seus direitos políticos por dez anos.

O ex-presidente teve a vida devassada, investigado em inquéritos policiais militares.

As autoridades o acusaram de um sem-número de falcatruas, como se fosse um ladrão voraz.

A acusação de maior apelo entre os opositores do ex-governante era a de que, na verdade, o apartamento da Vieira Souto era de Juscelino.

Sem renda para justificar tamanha ostentação, o ex-presidente ''corrupto'' teria preferido ocultar o patrimônio.

Portanto, Sebastião Pais de Almeida seria um laranja. Atípico, tal a sua fortuna, mas laranja.

Certa imprensa fez um Carnaval, chancelando as acusações da ditadura, como se vê em títulos de jornal reproduzidos neste post.

Na Justiça comum, nem julgamento houve.

O procurador considerou não haver provas de que Juscelino fosse o dono do apartamento.

E enumerou provas de que o imóvel pertencia mesmo a Sebastião Pais de Almeida, que o emprestara ao amigo JK.

O juiz mandou arquivar o processo.

Dei com as notícias _onze, abaixo e acima_ na apuração do meu próximo livro, uma biografia de Carlos Lacerda (1914-1977), cujo triplex na praia do Flamengo foi alvo dos seus adversários.

Os recortes integram o acervo do velho SNI, Serviço Nacional de Informações, criado justamente em junho de 1964. Estão no Arquivo Nacional.

É certo que outras publicações jornalísticas trataram do apartamento onde a família Kubitschek vivia.

Mas eu reproduzo o que tenho à mão, a papelada sobre Juscelino selecionada pelos arapongas.

O nome do jornal que veiculou cada texto é identificado pelos burocratas da ditadura na folha de papel onde os recortes foram colados.

Há um caso em que não se informa qual é o jornal.

E outro em que o título foi manuscrito.

Hoje, Juscelino Kubitschek é considerado grande brasileiro.

Dona Sarah dá nome a uma rede de hospitais de reabilitação.

Lula

A história do apartamento que não era de JK significa que o triplex do Guarujá não pertence ao ex-presidente Lula?

Não necessariamente.

Desconheço minúcias do inquérito e do processo sobre o petista.

Isso é com a polícia, o Ministério Público e a Justiça.

Sei é que, sem prova, pode se supor muita coisa.

Mas condenar por suposição não é fazer justiça.

Promiscuidade

Tanto no caso de JK quanto no de Lula há indícios de promiscuidade entre agentes públicos e privados.

Tal promiscuidade é condenável e faz mal ao Brasil.

Se é sempre crime ou não, são outros quinhentos.

( O blog está no Facebook e no Twitter )

 

6

01

2

3

7 a

7 b

10

11

9


O horror retrata a alma: estamos todos nus
Comentários Comente

Mário Magalhães

Na escuridão do Senado, o protesto das senadoras – Foto Pedro Ladeira/Folhapress

 

Há quem se horrorize com o protesto das senadoras que se sentaram nas cadeiras dos capi do Senado no dia da votação da reforma dita trabalhista.

Mas há quem se horrorize com a subtração de direitos e conquistas dos trabalhadores no país de desigualdade obscena _uma das dez maiores do planeta, de acordo com estudo da ONU publicado neste ano.

Há quem desqualifique como ridícula a ocupação da mesa do plenário pelas senadoras Fátima Bezerra, Gleisi Hoffmann, Katia Abreu, Lídice da Mata, Regina Souza e Vanessa Graziotin.

Mas há quem considere ridícula a denúncia do senador José Medeiros, ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, contra as senadoras. Porque o conselho que livrou o senador Aécio de Neves de punição não pode ser batizado com a palavra ética.

Há quem endosse esta declaração do presidente do Senado, Eunício Oliveira, sobre o episódio de ontem: ''É a desmoralização da Casa''.

Mas há quem pense que o que desmoraliza o Senado são fatos como a presidência ser entregue a gente como Eunício, identificado como o ''Índio'' na célebre planilha da Odebrecht.

Há quem acompanhe Michel Temer em seu aplauso às mudanças na CLT: ''Essa aprovação definitiva é uma vitória do Brasil na luta contra o desemprego e na construção de um país mais competitivo''.

Mas há quem acredite no diagnóstico da Organização Internacional do Trabalho, segundo a qual a dita reforma viola convenções internacionais de que o Brasil é signatário.

Opinião é opinião, cada cabeça uma sentença.

Ninguém é filho de chocadeira, dizia o João Saldanha.

Cada um se horroriza com o que quer.

O horror retrata a alma, radiografa a cabeça e desvenda o coração.

Estamos todos nus.

(O blog está no Facebook e no Twitter )


Golpes dentro do golpe
Comentários Comente

Mário Magalhães

Resultado de imagem para blog do mário magalhaes evandro teixeira 1964

Forte de Copacabana, tomado pelos golpistas, 1º de abril de 1964 – Foto Evandro Teixeira/Divulgação

 

Com a ruína do governo do golpista Michel Temer, identidades e dessemelhanças são evocadas, na comparação com os idos da ditadura parida em 1964.

Uma impropriedade da crônica jornalística e das interpretações historiográficas sobrevive nas incursões ao passado: qualificar o Ato Institucional Número 5 como ''o golpe dentro do golpe''.

O artigo definido indica singularidade na violência de dezembro de 1968. Aquela sexta-feira 13 seria a data do único golpe suplementar empreendido pelos sócios do golpe de 1964.

Não houve um único golpe. E sim numerosos golpes dentro do golpe.

O AI-5 do marechal-presidente Costa e Silva resultou em liquidação de habeas-corpus para oposicionistas, endurecimento da censura, fechamento do Congresso, cassação de mandatos parlamentares, suspensão de direitos políticos, asfixia dos direitos individuais e coletivos. Um vasto cardápio liberticida, provavelmente o mais amargo dos 21 anos de ditadura (1964-1985).

Mas a agressão à democracia não recrudescera de repente. Ela vinha de antes, de outros golpes.

Em julho de 1964, o mandato presidencial do marechal Castello Branco tinha sido prorrogado pelo Congresso deformado e intimidado pelos expurgos da ditadura. Terminaria em 1966. Ganhou um ano de bônus.

No mesmo mês, em decisão subestimada nas reconstituições históricas, o Congresso castrado pelo governo impôs a nova regra da maioria absoluta na eleição de presidente da República. Jânio Quadros (1960), Juscelino Kubitschek (1955) e Getulio Vargas (1950) tinham sido eleitos por maioria relativa. Até aí _a introdução do segundo turno_, tudo bem. O estranho era que, no excêntrico segundo turno, os cidadãos não voltariam às urnas; quem escolheria o presidente seriam deputados e senadores. Na prática, menos de quatro meses após o golpe de 1º de abril de 1964, o regime exterminou as diretas estabelecidas pela Constituição de 1946. Era muitíssimo improvável um candidato lograr 50% dos votos mais um. Um dos pretextos do consórcio que depusera o governante constitucional João Goulart era salvar a Carta de 1946…

Já somavam ao menos dois os golpes dentro do golpe. Mais um sobreveio com o AI-2, de outubro de 1965. Autoproclamado democrata e liberal, Castello dispensou as aparências e sepultou, com todas as letras e estatuto de indigente, a eleição direta para o Planalto. Extinguiu os partidos políticos _PSD, PTB e UDN eram os maiores. Aumentou o número de ministros do Supremo Tribunal Federal, para assegurar o domínio da corte. Enfraqueceu ainda mais os poderes do arremedo de Congresso independente.

Um mês depois, Castello baixou o Ato Complementar número 4, estipulando as exigências para a formação de ''organizações que terão atribuições de partidos políticos''. Nenhuma se chamaria partido. As normas draconianas só permitiram a criação de duas organizações, a Aliança Renovadora Nacional (Arena) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Eram conhecidos como o partido do ''sim, senhor'' e o partido do ''sim''. Foi outro golpe. Em seguida, irrompeu o do AI-3, que acabou com o pleito direto para governadores.

Um novo golpe chegou, em março de 1967, com a entrada em vigor de uma Constituição antidemocrática que substituiu a de setembro de 1946. O AI-4 dera ao Congresso descaracterizado prerrogativas para votar a Carta, composta nos termos determinados pela ditadura e sem consulta popular. A de 1946 havia sido elaborada por constituintes eleitos nas urnas.

A década de 1970 também foi tempo de golpe dentro do golpe. O Pacote de Abril de 1977 inventou a figura do senador biônico. Essa espécie peculiar não seria sufragada pelo conjunto dos eleitores, mas aclamada por minúsculos colégios eleitorais sob controle da ditadura. O general Ernesto Geisel temia que a Arena perdesse a maioria no Senado. De quebra, voltaram a fechar temporariamente o Congresso.

O AI-5 foi um estrondoso golpe dentro do golpe. Um de muitos.

Os golpes são como coelhas: gestam um filhote atrás do outro.

(O blog está no Facebook e no Twitter )


Cai ou não cai?
Comentários Comente

Mário Magalhães

Resultado de imagem para folhapress michel temer sinal de positivo

Michel Temer presidente: até quando? – Foto Beto Barata; 13.fev.2017/PR


O Vasco é muito maior do que o senhor feudal de São Januário
Comentários Comente

Mário Magalhães

Resultado de imagem para folhapress eurico miranda

Eurico Miranda, o capo: o Vasco não merece – Foto Ricardo Borges/Folhapress

 

Desde o sábado vulcânico em São Januário têm sido enumeradas obviedades necessárias: a punição do assassino do ajudante de eletricista David Rocha Lopes; a punição de quem arremessou bombas; a punição de quem permitiu a entrada dos artefatos explosivos no estádio; a punição, com perda de mando de campo, da agremiação em cuja casa e por obra de ditos torcedores seus a selvageria surgiu e se alastrou; e outras punições mais.

Por que tanta punição? Porque a impunidade é combustível da barbárie.

E por que ''ditos torcedores'', e não somente ''torcedores''? Porque enquanto permanecer a denominação pusilânime de torcedor para quem não está nem aí para o futebol a violência insensata e covarde será relativizada no esporte.

Dito o essencial, é um despropósito abordar a calamidade de São Januário como mal exclusivo vascaíno. Um sem-número de clubes nacionais abrigam cretinos como os que anteontem saíram de casa para aprontar, e não para torcer. A matança não acontece só no Rio, mas em outras cidades e Estados. Até, de autoria de brasileiros, além-fronteira. O combate, nesse aspecto, não é apenas contra as mazelas cruz-maltinas, mas ao banditismo com cores muito mais variadas.

A promiscuidade entre certas torcidas organizadas (a generalização é imprópria) e cartolas, mesmo os engomadinhos oriundos do mercado financeiro, dissemina-se país afora. Tornou-se comum uma torcida vincular-se a uma trincheira ou outra nas rinhas politiqueiras dos clubes. Os ingressos gratuitos são a face mais suave de tal associação daninha para os clubes, mas rendosa _no mínimo politicamente_ para os dirigentes. Essa vergonha não se restringe ao Vasco.

Com base na pancadaria mortal de São Januário, constitui desatino condenar a presença de duas torcidas _no caso a da casa e a do visitante, o Flamengo vitorioso por 1 a 0. O pau se concentrou entre ditos vascaínos.

Aí mora uma tragédia particular do Vasco. Na ambição de eternizar o poder para o seu clã, Eurico Miranda transformou o clube num caldeirão de ressentimentos, ódios e vinganças. No sábado, o caldeirão transbordou.

Não é indispensável ser vascaíno _ eu não sou_ para reconhecer, além da condição de gigante futebolístico, o imenso lugar social e histórico do Clube de Regatas Vasco da Gama na formação social e cultural brasileira. O Vasco é um orgulho do Brasil. (Palavra de um torcedor do Flamengo com pai, uma irmã e dois irmãos vascaínos.)

De tão grande o clube, enfatiza-se a aberração de ser comandado por Eurico.

No tempo em que, para o bem e para o mal, o capitalismo vinga também no futebol, o Vasco parece parado no tempo.

Tem elenco mais fraco do que clubes com torcida muito menor.

O senhor feudal que o controla é aquele que uma vez contou ter sido assaltado quando levava para casa o dinheiro da renda de um jogo.

E cujos acólitos espalhavam que poderia se suicidar em caso de rebaixamento do Vasco para a segundona. O Vasco caiu, e Eurico continuou vivíssimo.

É um personagem passadista e sombrio. Mantém a pinta de protagonista de filme do Coppola.

Ele precisa do Vasco.

O Vasco não precisa dele.

Isso sempre esteve claro, mas muitos tentaram enganar dizendo que era o contrário.

E outros se deixaram enganar.

Para o bem do Vasco e do futebol, é hora de o engano acabar.

(O blog está no Facebook e no Twitter )